By: Pb Paulo Cristiano
Site: CACP
No dia 05 de dezembro foi para votação o projeto de lei 7.672/10, da deputada Maria do Rosário, do PT/RS que propõe a alteração da Lei 8069, de 13/07/1990, o Estatuto da Criança e do Adolescente, e da Lei 10406, de 10/01/2002, o Novo Código Civil.A alteração pretende objetivar ainda mais a lei contra maus tratos já previsto no ECA e no Código Civil. A alteração explicitaria a proibição dos pais ou responsáveis de usarem a força física para disciplinar crianças e adolescentes.
A “lei da palmada”, como ficou conhecida, é mais um na lista dos inúmeros projetos polêmicos proposto pelo Governo Federal para a sociedade brasileira.
Se tal projeto, de fato, transformar-se em lei, os pais que baterem em seus filhos, mesmo de forma moderada, uma palmadinha no bumbum, por exemplo,“ficarão sujeitos às medidas previstas no artigo 129, incisos I, III, IV e VI do Estatuto da Criança e do Adolescente”, que, entre outras coisas, define que aos culpados caberá o encaminhamento ao tratamento psicológico e psiquiátrico juntamente com a criança ou adolescente.
É louvável a preocupação com os maus tratos que diuturnamente são infringidos à muitas crianças no Brasil. Somos solidários com a iniciativa de evitar a propagação de uma cultura de violência como única forma de educar as crianças. É inadmissível que aqueles que deveriam zelar e proteger essa minoria indefesa, em alguns casos, são eles os maiores violadores desse direito.
Sabemos que assuntos desta categoria têm a capacidade de gerar enorme celeuma, e em decorrência disso, absorver argumentos pró e contra sua validade, enriquecendo de modo significativo a questão que, diga-se de passagem, é de vital importância para a discussão democrática da sociedade brasileira.
Ciente disso, pretendo trazer mais um pouco de contribuição para o debate, salientando aqui, algumas reflexões sobre a validade ou não do projeto.
Se por um lado o projeto pode presumivelmente coibir aqueles pais que costumam abusar da autoridade paterna ao educarem seus filhos, a ponto de agredi-los, por outro lado, tal projeto esbarra em inúmeras dificuldades de ordem filosófica, religiosa, jurídica, política e pedagógica.
Para isso é imprescindível refletirmos sobre algumas questões pertinentes à problemática tais como, até que ponto a imposição de mais uma lei será a solução para a violência no Brasil? As premissas em que está baseada a justificativa do projeto são válidas? O limiar entre direitos individuais e intervenção estatal será afetado com esta lei?
1. A questão política - Muito embora saibamos que em qualquer sociedade a criação de leis seja salutar para a eficácia das normas para o bem comum, o caso é que no Brasil isso virou um vício político. O pragmatismo positivista brasileiro de sanar os sintomas sem atacar as causas é mais um atestado de incompetência política do Estado que entope a sociedade brasileira com leis e mais leis, sem, contudo,ter eficácia. O senso comum político acredita que a simples criação de leis tem o poder sobrenatural de solucionar problemas.
Junta-se a isto o fato de que, como está posta, tal lei nitidamente ultrapassa os limiares dos direitos individuais da família. Sem ser redundante, perguntamos: Até que ponto essa lei não configura em controle estatal arbitrário sobre os direitos individuais de cada cidadão?
Já que o projeto tangencia questões de foro íntimo, o mais correto seria realizar um plebiscito para saber a opinião popular como um todo e não arbitrariamente impô-lo garganta abaixo às famílias brasileiras.
Mas para quem pensa que este projeto é original está muito enganado. Essa proposta de lei está escorada nos ditames do Comitê de Direitos Humanos da ONU. Ao Brasil foi “recomendado” (ou imposto) alterar a legislação para proibir, explicitamente, os castigos corporais.
2. A questão lógica - Outra ambigüidade neste projeto é o conceito de violência apresentado pela autora. Para ela, toda forma de correção física seja moderada ou não configura em violação aos diretos da criança e do adolescente, o que é no mínimo questionável.
Segundo seu ponto de vista, uma palmada e um espancamento são equivalentes.
A autora do projeto parece ignorar de propósito a nítida diferença entre moderação e excesso.
3. A questão pedagógica - Uma coisa é proteger a criança contra abuso de pais que chegam bêbados e espancam e maltratam seus filhos, outra bem diferente é proibir a disciplina com fim pedagógico, de modo moderado, quando assim for conveniente aos pais. E, quem disse que a palmada não pode ser funcional? Ora, as correções infligidas moderadamente pelos pais, inclusive física, também fazem parte da socialização da criança!
É sabido que o sistema cognitivo da criança ainda está em desenvolvimento. Isso faz com que ela apresente pouca capacidade de abstração e por isso a correção deve ser em alguns casos mais concreta. Isso é algo empírico, passivo de observação e de fácil constatação. Em certas faixas etária a criança tem dificuldade de entender por si mesma o diálogo. Ela não tem condições de enxergar o mal em si e para si, mas como não vê seus atos como necessariamente errados, seu comportamento tende a reafirmar o desejo e é aí que se insere a correção física moderada. Não se trata de corrigir pela surra simplesmente, mas de reforçar o esforço dialógico com este expediente. Isso chamará a atenção da criança para enxergar mais facilmente os limites sociais dentro do contexto do lar, o que através apenas do diálogo seria, em alguns casos, ineficaz.
4. A questão democrática - Ora, se estatísticas possuem algum valor nessa discussão, então ela indica duas coisas importantes: a primeira é que as estatísticas indicam que a maioria da população é contra esta lei, a Datafolha concluiu que 54% das pessoas ouvidas são contrárias à aprovação do projeto; 36% são a favor, em outra instituição de pesquisa 64,04 % são contra e apenas 32,02 a favor, a segunda é que a ausência de castigo físico não é a solução para a diminuição da violência já que 72% dos entrevistados que alegaram ter apanhado dos pais, apenas 58% destes bateram alguma vez em seus filhos. Visto por este prisma, conclui-se que a garotada está apanhando cada vez menos. Mas o que nós temos visto é um aumento da violência, ano após ano. Há uma ausência de referenciais de autoridade na sociedade em geral e entre os jovens e adolescentes em particular. São crianças que batem em professores, que batem nos pais e que enfrentam a polícia, sem punição alguma.
Creio que o ECA está sendo mal interpretado. Estamos vivendo a ditadura dos direitos. A imagem de cidadania que estamos construindo para essa geração está distorcida. Transformou-se em um conceito unilateral, onde o jovem enxerga apenas diretos e nunca deveres!
5. A questão da ética - E por falar em direitos, percebemos outra contradição com as políticas públicas do PT, posto que ao mesmo tempo em que o governo quer impor uma lei sob a alegação de proteger os diretos das crianças e adolescentes da tirania e da violência dos adultos, este mesmo governo tenta aprovar um projeto de lei para legalizar o aborto. Ora, o que é pior, dar palmadas na criança com o fito de corrigi-la ou matar uma que nem ao menos consegue expressar sua vontade? O critério do Governo parece levar a absurda conclusão de que quando é para corrigir seus filhos as mães estão proibidas, mas para matá-los estão liberadas! Cadê os direitos humanos nessa hora? Ah, para fetos não há direitos humanos! Na mentalidade de pessoas como a autora do projeto (que assume o aborto como direito da mulher), a criança no ventre não possui direitos, ou como alegam por aí, não é pessoa juridicamente protegida pelo Estado. Essa postura não é só contraproducente, mas é com todas as cores, o reflexo da hipocrisia de um governo que se afina pela filosofia do politicamente correto.
A correção ou não dos filhos é um direito da família, é ela e somente ela que deverá decidir a melhor forma de criá-los.
Esse projeto, junto com outros do mesmo naipe, parece ser mais uma investida da deplorável política de controle estatal apresentada pelo Estado.
6. A questão filosófica - É alegado no projeto que a mesma violência que reprovamos entre adultos, por exemplo, agressão contra idosos deve ser igualmente repelida nas crianças. Ora, a notável deputada cometeu aí um erro sutil de categoria, não sei se de propósito (com o objetivo de levar a sociedade ao erro), ou por incompetência dialética ao construir o discurso com retórica defeituosa.
Sabemos que o adulto tem em si uma estrutura psicológica já amadurecida para distinguir entre o certo e o errado. Quando um adulto bate em outro adulto e filhos batem em seus pais idosos NUNCA é com o intuito de corrigir, educar, mas de agredir. A agressão é o foco, não a correção. A linguagem pedagógica das palmadas e da correção física moderada que não causa lesões corporais, é dispensável em adultos, mas muito eficaz em crianças em determinadas ocasiões. Dar o mesmo peso às duas coisas (que são completamente distintas) é laborar em erro de lógica. Espancamento e brigas entre adultos nem de longe está na mesma categoria das correções físicas moderadas com finalidade educativa.
Também o argumento de que a correção física moderada vai gerar a longo prazo mais violência, pois tal criança alegadamente reproduzirá os “maus tratos” sofridos em outros é em parte falacioso. Dizemos em parte falacioso devido à generalização embutida no argumento. Além de carecer de dados mais concretos (pesquisas e estatísticas) que comprove tal assertiva, é ignorado o fato de que a violência pode ter diversas causas e não somente a agressão física. A agressão física pode contribuir sim, mas não é determinante para o desencadeamento da violência. Para isso a parlamentar só precisaria consultar o cidadão comum. Quantas crianças que apanharam de seus progenitores e que hoje são bons pais?! Com certeza a maioria esmagadora.
7. A questão religiosa – A sabedoria popular é expressa de modo claro no livro sapiencial bíblico de Provérbios ao dizer “Não retires da criança a disciplina; porque, fustigando-a tu com a vara, nem por isso morrerá” e “A vara e a repreensão dão sabedoria; mas a criança entregue a si mesma envergonha a sua mãe” [Pv 13.24; 22.15; 23.13,14; 29.15].
A censura imposta pelo governo é um recado velado de que a família brasileira não é competente o bastante para educar seus filhos. A preocupação para com a violência infantil, apesar de legítima, não serve como argumento para generalizações superficiais. O espancamento de crianças e adolescentes é algo pontual e com certeza reprovado pela maioria esmagadora da população. Nenhum pai em sã consciência aprovaria o espancamento como forma de correção.
Para mim este projeto é inviável não só porque é arbitrário, mas porque seus argumentos estão construídos com base em premissas defeituosas.
8. A ambigüidade sobre o conceito de violência - Alega-se ainda que a preocupação maior é proteger a criança da violência. Mas qual violência? Existem vários tipos de violência, inclusive a simbólica. Mesmo o isolamento da criança em um quarto ou a privação de um objeto é uma forma de castigo, portanto, também de violência. Às vezes uma palavra mais dura na hora do aborrecimento causaria mais dor em uma criança do que uma simples palmada.
Tenho para mim que este projeto está jogando a água suja juntamente com a criança para fora da banheira!
Outro argumento usado pela autora do projeto é o de que os pais devem buscar novas alternativas como forma de correção e não a violência.
É lógico que o diálogo deve vir em primeiro lugar, mas há casos e casos! Não podemos ignorar o fato de que crianças são personalidades. Enquanto um firme “não” pode ser muito eficaz na correção de uma, para outra já não é o suficiente.
Mas o perigo mais grave desta lei é colocar no mesmo patamar os pais que amam seus filhos e aplicam a disciplina física moderada com pais relapsos espancadores de crianças.
Quem espanca criança vai continuar fazê-lo com lei ou sem lei. A “lei Maria da Penha” e a “lei seca“, é um exemplo de que a lei por si mesma não possui o poder de mudar seus infratores.
O projeto é polêmico e peca pelo excesso. As legislações contidas no ECA, no Código Civil e Penal já prevê punição para tratamentos degradantes contra o cidadão e cumpre bem essa função.
Portanto, sou contra o projeto por todos os motivos expostos acima mas principalmente porque vai de encontro à Palavra de Deus.
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COMENTÁRIO DO PR AÉCIO: Faço coro ao parecer do Prof Paulo Cristiano. Lamento que não existam vozes como esta lá em Brasília, visto que por mero partidarismo (ou covardia, sei lá) não houve maior resistência por parte dos políticos evangélicos que circulam por lá. Estes, em sua grande maioria, nem de longe representam o pensamento evangélico brasileiro - pelo menos o meu não!
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