Papa: Sobre esta pedra?
FONTE: CACP
“Respondendo Simão Pedro, disse: Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo. Então, Jesus lhe afirmou: …tu és Pedro [petros] e sobre esta pedra [petra] edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela”. – Mateus 16.16-18
“Apascenta os meus cordeiros… Pastoreia as minhas ovelhas… Apascenta as minhas ovelhas”. – João 21.15-17
Após
a confissão de fé de Pedro, ele [Cristo] determinou que sobre ele
construiria a sua Igreja; a ele prometeu as chaves do reino dos céus… –
Vaticano II [1]
Um papa infalível como sucessor de Pedro, que tem
as chaves do reino do céu, sendo o vigário de Cristo? Antes foi a
declaração arrogante de que a pompa e os poderes foram herdados de
Constantino. Hoje afirma-se que a declaração de Cristo a Pedro fez dele o
primeiro papa, a pedra sobre a qual “a única Igreja verdadeira” foi
construída, e todos os que o seguiram nesse ofício têm sido seus
sucessores, não importa a violência e as fraudes que usaram para
consegui-lo, nem suas atitudes malignas. A autoridade que o papa possui
hoje e a religião católica que ele lidera estão ancoradas sobre essa
afirmação.
O papa é a Igreja Católica. Sem ele a Igreja não
poderia funcionar e nem mesmo existir. Por isso é importante estudarmos
esse assunto mais a fundo. Pouco importa o que o fiel católico comum
pense ou faça. Mas as doutrinas e os feitos da hierarquia e
principalmente dos papas continuam controlando a Igreja. É aí que o
nosso foco deve estar, não na opinião de alguns católicos que dizem não
acreditar na metade do que a Igreja ensina. (Essas pessoas não deveria
se chamar “católicas”. Por que confiar numa Igreja para obter a salvação
eterna se ela nem é digna de confiança em assuntos menos importantes?)
E que dizer da declaração de Cristo a Pedro: “sobre esta pedra edificarei a minha igreja?”(Mateus 16.18). Os protestantes argumentam que existe um jogo de palavras no verso chave acima. No grego, “Pedro” é petros, uma pedrinha, enquanto “pedra” no grego é uma petra,como a rocha de Gibraltar, por exemplo. Uma petra tão imensa obviamente só poderia ser o próprio Cristo e a confissão de que Jesus é o Cristo, que Pedro acabara de fazer.
Os
apologistas católicos modernos respondem que Cristo estava
provavelmente falando em aramaico, o que elimina o jogo de palavras e
deixa Pedro como a pedra sobre a qual a Igreja foi edificada. Essa
posição, contudo, certamente nega uma das doutrinas básicas do
catolicismo romano, a profissão de fé tridentina. Ela exige que todos os
clérigos, a partir do papa Pio IV (1559-1565), aceitem a interpretação
das Sagradas Escrituras somente de acordo com o consenso unânime dos
Pais [da Igreja].
O Testemunho dos Pais da Igreja
Como os
“Pais da Igreja” (líderes da Igreja até o papa Gregório, o Grande, que
morreu em 604) interpretam esta passagem? Acontece que neste assunto em
particular eles são unânimes em concordar com a posição dos
protestantes. Nenhum deles interpreta essa passagem como os católicos
são ensinados a entendê-la atualmente.
Para estar de acordo com o
ensino unânime dos Pais da Igreja, um católico teria de rejeitar o dogma
de que Pedro foi o primeiro papa, que ele era infalível e que
transmitiu sua autoridade a sucessores. O historiador e católico devoto
Von Dollinger lembra fatos inegáveis:
De todos os Pais que interpretam estas passagens nos Evangelhos (Mateus 16.18, João 21.17), nenhum as aplica ao bispo de Roma como sucessor de Pedro.Quantos
Pais se ocuparam com estes textos, mas nenhum daqueles cujos
comentários possuímos – Orígenes, Crisóstomo, Hilário, Agostinho,
Cirilo, Teodoro e aqueles cujas interpretações são coletadas às centenas
– têm sequer insinuado que o primado de Roma é a conseqüência da
comissão e promessa feita a Pedro!
Nenhum deles explicou que a
pedra ou fundamento sobre o qual Cristo construiria a sua Igreja seria o
ofício dado a Pedro que devia ser transmitido aos seus sucessores, mas
entenderam que se tratava do próprio Cristo ou da confissão de fé de
Pedro sobre Cristo; muitas vezes afirmando que eram as duas coisas
juntas.[2]
Em outras palavras, ao contrário do que a maioria dos
católicos tem aprendido, os Pais da Igreja Católica Romana
posicionaram-se unanimemente contra a interpretação católica atual. E é
um católico devoto, uma autoridade da história eclesiástica e que ama a
sua Igreja, quem aponta para esses fatos.
Outros historiadores
católicos concordam com Von Dollinger. Peter de Rosa, também católico
devoto, habilmente contesta a supremacia e a linha contínua de sucessão
papal desde Pedro:
Pode ser um choque para eles [católicos] saber
que os grandes Pais da Igreja não viam conexão alguma entre a declaração
[Mateus 16.18] e o papa. Nenhum deles aplica “Tu és Pedro” a alguém
mais senão a Pedro. Um após outro, todos analisaram-na: Cipriano,
Orígenes, Cirilo, Hilário, Jerônimo, Ambrósio, Agostinho. E eles não são
protestantes.
Nenhum deles chama o bispo de Roma de “pedra” ou
aplica especificamente a ele a promessa das chaves do reino. Isso é tão
surpreendente para os católicos, como se eles não pudessem encontrar
menção alguma dos Pais sobre o Espírito Santo e a ressurreição dos
mortos…
Para os Pais é a fé de Pedro – ou o Senhor em quem Pedro
deposita sua fé – que é chamado de “pedra” e não Pedro. Todos os
concílios da Igreja, de Nicéia, no século IV, ao de Constância, no
século XV, concordam que o próprio Cristo é o único fundamento da
Igreja, isto é, a pedra sobre a qual a Igreja se sustém.
…nenhum
dos Pais fala de uma transferência de poder de Pedro aos que o sucederam
…Não há indicação alguma de um ofício petrino permanente.
Então a
Igreja primitiva não olhava para Pedro como bispo de Roma, nem, por
conseguinte, pensava que todo bispo de Roma seria o seu sucessor… Os
evangelhos não criaram o papado; porém o papado buscou apoio nos
Evangelhos [mesmo que isso não seja possível].[3]
O fato dos papas durante séculos terem se baseado em documentos fraudulentos (A Doação de Constantino e os Falsos Decretos)
para justificar sua pompa e poder, mesmo após terem sido expostos como
deliberadas falsificações, mostra como esses “vigários de Cristo” não
apreciavam a verdade. Também nos mostram que naqueles dias os papas não
baseavam suas justificativas para a sua autoridade papal e a suposta
sucessão apostólica desde Pedro em Mateus 16.18. Se isso ocorresse eles
não precisariam de documentos falsos para autenticar sua posição. Tal
aplicação para as palavras “Tu és Pedro” foi inventada muito mais tarde.
Quem é a Pedra?
A
verdade sobre o assunto não depende da questionada interpretação de
alguns versículos, mas sim da totalidade das Escrituras. O próprio Deus é
claramente descrito como a “pedra” ou “rocha” infalível de nossa
salvação através de todo o Antigo Testamento. (Deuteronômio 32.3,4;
Salmo 62.1,2, etc.). Na verdade a Bíblia declara que Deus é a única pedra: “Pois quem é Deus, senão o SENHOR? E quem é rochedo, senão o nosso Deus?” (Salmo 18.31).
O
Novo Testamento torna igualmente claro que Jesus Cristo é a pedra sobre
a qual a Igreja é construída, e que Ele, sendo Deus e um com o Pai, é,
portanto, a Pedra. Cristo e Seus ensinamentos (Mateus 7.24-29) são rocha
onde o “homem prudente edifica a sua casa”, e não Pedro. O próprio apóstolo Pedro frisa que Cristo é a “pedra angular” sobre a qual a Igreja é construída (1 Pedro 2.6-8). E ele cita uma passagem do Antigo Testamento para enfatizar isso.
Paulo, do mesmo modo, chama Cristo “a pedra angular” da Igreja e declara que a Igreja também é edificada “sobre o fundamento dos [todos] apóstolos e profetas” (Efésios 2.20). Esta declaração nega claramente que Pedro tenha uma posição especial no fundamento da Igreja.
Pedro Não Recebeu Promessa Alguma
Quando Cristo deu a Pedro “as chaves do reino dos Céus” (Mateus 16.19), Ele explicou o que aquilo significava: “o que ligares na terra terá sido ligado nos céus; e o que desligares na terra terá sido desligado nos céus”.
A mesma promessa foi renovada a todos os discípulos em Mateus 18.18,
assim como em João 20.23, com a especial aplicação, neste contexto, ao
perdão de pecados.
A chave para ligar e desligar e remir ou reter
pecados foi claramente dada a todos, não só a Pedro. Portanto, não é
certo afirmar que Pedro tinha poder e autoridade especial sobre os
demais apóstolos. Tal conceito não se encontra em parte alguma do Novo
Testamento e era desconhecido mesmo para a Igreja Católica Romana até
alguns séculos mais tarde. A Pedro foi dado o privilégio especial
de pregar o Evangelho, primeiro aos judeus (Atos 2.14-41) e depois aos
gentios (Atos 10.34-48), mas ele não recebeu nenhuma autoridade especial.
Os apologistas católicos alegam que as palavras de Cristo a Pedro em João 21.15-47 (“apascenta meus cordeiros”, “pastoreia as minhas ovelhas”)
deu-lhe autoridade única. Pelo contrário, o próprio Pedro aplicou esse
mandamento a todos os anciãos (1 Pedro 5.2) do mesmo modo que Paulo fez
(Atos 20.28). Novamente é Von Dollinger quem nos informa:
Nenhuma
das antigas confissões de fé, nenhum catecismo, nenhum dos escritos
patrísticos, que visavam instruir o povo, contém uma sílaba sequer sobre
o papa, nem sequer uma indicação mínima sobre o fato de toda certeza da
fé e doutrina depender dele…
Os Pais da Igreja nem ao menos
puderam reconhecer no poder das chaves, e no poder de ligar e desligar,
qualquer prerrogativa ou senhorio do bispo de Roma, tanto mais que – o
que à primeira vista fica óbvio para qualquer um – eles não viram um
poder dado primeiramente a Pedro, e em seguida repetindo precisamente as
mesmas palavras a todos os apóstolos, como algo que fosse peculiar a
ele, ou uma herança para a linhagem dos bispos de Roma, e eles usavam o
símbolo das chaves significando exatamente o mesmo que a expressão
figurada de ligar e desligar…
O poder das chaves ou de ligar e
desligar, foi universalmente reconhecido como pertencente a outros
bispos, tanto quanto ao bispo de Roma.[4]
Nenhum Poder Especial Foi Dado a Pedro
A
autoridade especial que tem sido alegada pelos papas católicos romanos,
que afirmam ser os supostos sucessores de Pedro, jamais foi exercida
por Pedro. Em suas epístolas o apóstolo exorta seus iguais; não dá
ordens a subordinados. “Aos presbíteros que há entre vós, eu, presbítero como eles…” (1 Pedro 5.1). Ele
não oferece base em seus escritos para nenhuma posição ou poder
eclesiástico oficial e exaltado. Pedro declara ser simplesmente “testemunha dos sofrimentos de Cristo” (1 Pedro 5.1) junto com todos os apóstolos, que foram “testemunhas oculares da sua majestade” (2 Pedro 1.16). Ele não faz uma única afirmação em seu favor, simplesmente se coloca entre os outros apóstolos.
A
reunião de “apóstolos e anciãos” em Jerusalém por volta de 45-60 d.C.
descrita em Atos 15.4-29 foi organizada por iniciativa de Paulo, não de
Pedro. (Não foi “o primeiro Concílio da Igreja”, como alguns afirmam.
Não havia hierarquia na Igreja, nenhuma delegação de fora, todos os
presentes residiam em Jerusalém.) Além do mais, foi Tiago, e não Pedro,
quem parece ter tomado a liderança. Conquanto Pedro tenha feito uma
declaração importante, ela não foi doutrinária, sendo apenas um resumo
de sua experiência ao levar o Evangelho primeiro aos gentios. Tiago,
contudo, discorreu sobre as Escrituras e argumentou sobre um ponto de
vista doutrinário. Além do mais, foi Tiago quem disse: “Pelo que julgo eu… [meu veredito é]” (Atos 15.19) e sua declaração tornou-se a base da carta oficial enviada a Antioquia.
Não
há evidências de que Pedro tenha intimidado os outros, mas Tiago o
intimidou. O temor de Tiago e sua influência e liderança levaram Pedro a
se voltar à tradicional separação dos gentios. Como resultado, Paulo,
que escreveu muito mais do Novo Testamento do que Pedro, e cujo
ministério foi muito mais abrangente, censurou Pedro publicamente por
seu erro (Gálatas 2.11-14). Certamente Pedro não agia como papa, nem era
tratado assim pelos outros.
Os Verdadeiros Sucessores dos Apóstolos
Cristo
mandou que os apóstolos fizessem discípulos através da pregação do
Evangelho. Ele acrescentou que cada pessoa que cresse no Evangelho
deveria ser ensinada a obedecer a todas as coisas que Ele havia
ensinado. A declaração: “ensinando-os [aos discípulos que se converterão] a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado” (Mateus 28.20), não pode ser atribuída exclusivamente a uma liderança hierárquica. Esperava-se que todos aqueles que se tornaram discípulos de Cristo através da pregação dos discípulos originais obedecessem a tudo que
Cristo havia ordenado aos apóstolos. Para que pudessem fazer tudo que
os 11 foram comissionados, cada discípulo comum precisava ter a mesma
autoridade e o mesmo poder procedentes de Cristo que os apóstolos
tinham.
Quaisquer que tenham sido os mandamentos e poderes que os
apóstolos receberam de Cristo, eles foram passados a todos os que creram
no Evangelho (ou seja, seus próprios discípulos), os quais, por sua
vez, ensinaram esses mandamentos aos seus conversos, e assim por diante,
até o presente. Portanto fica evidente que não somente uma classe
especial de bispos, arcebispos, cardeais, papas ou um Magistério, são sucessores dos apóstolos, mas todos os cristãos.
A
história da Igreja primitiva apresentada no Novo Testamento diz isso.
Os apóstolos obedeceram ao que Cristo mandou: fizeram discípulos aos
milhares e ensinaram a eles todos os mandamentos de Cristo; e o próprio
Cristo, do céu, capacitava seus novos discípulos para desempenharem esta
grande comissão. Os cristãos se multiplicaram e as igrejas foram
estabelecidas em todo o Império Romano.
Não havia catedrais. A
igreja local se reunia nas casas. Sua liderança era um grupo de anciãos
piedosos, mais velhos e maduros na fé e que viviam vidas exemplares. Não
havia hierarquia, nem local ou tampouco sobre um território maior, que
tivesse de ser obedecida por causa de seu ofício ou título. Não havia
classe seleta de sacerdotes que possuísse autoridade especial para agir
como intermediária entre Deus e o povo. Isso se aplicava ao sacerdócio
judaico, que era uma sombra das coisas que haveriam de vir (Hebreus
7.11-28; 10.1-22) mas tornou-se terrivelmente corrupto e teve seu fim no
sacrifício feito na cruz.
Todos os crentes foram encorajados a orar e profetizar nas reuniões da Igreja. Paulo deixou isto bem claro: “Quando vos reunis [como Igreja], um
tem salmo, outro, doutrina, este traz revelação, aquele, outra língua, e
ainda outro, interpretação. Seja tudo feito para edificação. No caso de
alguém falar em outra língua, que não sejam mais do que dois, ou quando
muito três, e isto sucessivamente, e haja quem interprete… Tratando-se
de profetas, falem apenas dois ou três, e os outros julguem. Se, porém,
vier revelação a outrem que esteja assentado, cale-se o primeiro [a fim de que o outro fale]. Porque
todos podereis profetizar um após outro, para todos aprenderem e serem
consolados… Portanto, meus irmãos, procurai com zelo o dom de profetizar
e não proibais o falar em outras línguas” (1 Coríntios 14.26-40).
Não Havia uma Classe de Elite
Nenhuma das promessas de Cristo aos apóstolos foi somente para eles ou para uma classe de elite. Por exemplo: “Se
dois dentre vós, sobre a terra, concordarem a respeito de qualquer
coisa, que, porventura, pedirem, ser-lhes-á concedida por meu Pai que
está nos céus” (Mateus 18.19). “Tudo quanto pedirdes em meu nome, isso
farei…” (João 14.13) e novamente: “Se pedirdes alguma coisa ao Pai, ele vo-la concederá em meu nome” (João 16.23).
Todos os cristãos que crêem na Bíblia oram em nome de Cristo, embora a
promessa tenha sido dada ao Seu círculo íntimo de apóstolos. Todos os
católicos tomam o pão e o vinho na missa, mesmo que Cristo tenha dito a
todos os apóstolos: “Fazei isto em memória de mim” (Lucas 22.19).
Está
claro que tudo o que Cristo determinou a seus amigos mais chegados se
aplicava a todos os convertidos e a todos os cristãos de hoje. Isso quer
dizer que se dois cristãos concordarem sobre alguma coisa em oração
esta lhes será concedida, ou que tudo o que um cristão pedir ao Pai, em
nome de Cristo, lhe será dado? Sim. Então, por que nem toda oração é
respondida? Todas elas são respondidas, mas para algumas a resposta é
“não” e para outras, “mais tarde”. O “nome” de Cristo não é uma fórmula
mágica, que, se adicionada à oração, assegura uma resposta automática
positiva. Pedir em Seu nome significa pedir como Ele pediria, para Sua
honra e glória, não para a nossa.
Nesse ponto a Igreja tem
decepcionado tremendamente os católicos sinceros. Cada oração que um
padre católico faz não é respondida automaticamente mais do que aquelas
feitas pelos católicos comuns, ministros protestantes ou leigos. Isso é
obvio. Ainda assim diz-se que um membro do clero católico tem um poder
especial sobre qualquer coisa que ele pronunciar usando o nome de Cristo
– o que for ligado ou desligado, ou o perdão de pecados – ocorre
automaticamente. Não é assim. É desonesto dizer que o desligamento do
pecado (que não pode ser verificado) ocorre a cada vez que o sacerdote o
pronuncia, se desligar da doença ou do débito (algo que pode ser
verificado) raramente acontece quando ele pronuncia o desligamento.
A
implicação é clara: qualquer coisa que se obtenha através da oração ao
Pai em nome de Cristo, ou qualquer graça obtida quando dois cristãos
concordam, ligar e desligar ou perdoar pecados, não acontecem
automaticamente, pela mera expressão de uma fórmula, mas é feito somente
através de Cristo trabalhando por meio de vasos escolhidos, quando,
onde e como Lhe agrada.
Nenhuma dessas promessas era cumprida
automaticamente, sob a direção única de Pedro ou qualquer um dos outros
apóstolos. Nem são concedidas instantaneamente a um membro da Igreja
Católica Romana ou de qualquer hierarquia religiosa. Esses dogmas falsos
têm posto aqueles que acreditam neles sob o poder de Roma, levando-os a
procurar num sacerdote aquilo que é a herança de todo discípulo
verdadeiro de Cristo.
Os Tiranos do Passado e o Magistério de Hoje
O
grande apóstolo Paulo escreveu que desde que os governantes civis não
ordenem algo contrário à vontade Deus, todo cristão, inclusive os
próprios apóstolos, devem obedecer suas ordens (Romanos 13.1-7). Devemos
orar “pelos reis e por todos os que estãoinvestidos de autoridade” (1 Timóteo 2.1-3). Todos os cristãos devem estar sujeitos “aos que governam, às autoridades…” (Tito 3.1).
Paulo escreveu aos cristãos: “Sujeitai-vos a toda instituição humana por causa do Senhor, quer seja ao rei como soberano, quer às autoridades como enviadas por ele…” (1 Pedro 3.13-14). Os
papas ensinaram exatamente o contrário: que eles eram os supremos
soberanos e que somente suas leis deveriam ser obedecidas, inclusive
pelos reis. A submissão total que Roma exige tem sido expressa por
muitos papas, mas nenhum deles as expressou mais claramente do que
Nicolau I (858-867):
É evidente que os papas não podem estar
ligados nem tampouco sujeitos aos poderes terrenos, nem mesmo aos do
apóstolo [Pedro], se ele voltasse à terra; desde que Constantino, o
Grande, reconheceu que os pontífices representam o poder de Deus na
terra, a divindade não pode ser julgada por nenhum homem. Somos,
portanto, infalíveis, e quaisquer que sejam nossos atos, não precisamos
prestar contas deles a ninguém mais do que a nós mesmos.[5]
Fica
claro, tanto na história como nos dogmas oficias da Igreja ainda
vigentes, que Nicolau não estava expressando apenas o seu fanatismo, mas
a visão de todos os papas, que acabou se tornando a doutrina católica.
Conforme o Vaticano II, a ninguém é permitido sequer questionar o Magistério em
assuntos de fé e moral. Somente a hierarquia pode interpretar a Bíblia,
e os fiéis devem aceitar essa interpretação como se fosse vinda do
próprio Deus. Todos devem obedecer ao papa, mesmo quando ele não fala ex catedra. Tais exigências de fé cega são vestígios atuais da atuação tirânica dos papas através dos séculos.
O Fracasso do “Primeiro Papa”
Se
as palavras de Cristo a Pedro em Mateus 16.18 fizeram dele o primeiro
papa infalível, então temos outro problema sério. As palavras seguintes
na boca de Pedro negam o cerne do Evangelho cristão ao declarar que
Cristo não precisava ir até a cruz: “…Tem compaixão de ti, Senhor; isso [a morte na cruz] de modo algum te acontecerá” (Mateus 16.22). Ao que o Senhor respondeu imediatamente: “Arreda,
Satanás! Tu és para mim pedra de tropeço, porque não cogitas das coisas
de Deus, e sim das obras dos homens” (Mateus 16.23). Esta foi a primeira declaração ex catedra de
Pedro a toda a Igreja (conforme registra a Bíblia) em matéria de fé e
moral (ela tem a ver com o meio de salvação) – e não era infalível, mas
pura heresia!
No próximo capítulo Pedro comete um erro sério, com
outro pronunciamento herético. Ele coloca Cristo no mesmo nível de
Moisés e Elias: “Senhor, bom é estarmos aqui; se queres, farei aqui
três tendas; uma será tua, outra para Moisés, outra para Elias” (Mateus
17.4).Desta vez é o próprio Deus quem censura, do céu, o “novo papa”: “Este é o meu Filho amado em quem me comprazo; a ele ouvi” (v. 5).
Mais
tarde, temendo por sua vida, Pedro nega, pragueja e jura não conhecer
Jesus – novamente uma declaração de “fé e moral” a toda a Igreja que
nega o próprio Cristo. Mesmo se os papas fossem seus sucessores, Pedro
dificilmente poderia ter-lhes passado uma infalibilidade que,
obviamente, não possuía.
Base Bíblica para a Infalibilidade?
Hans Küng, teólogo católico contemporâneo, disse: “A principal prova citada pelo Vaticano I para a infalibilidade papal, Lucas 22.32 (“Eu, porém, roguei por ti, para que a tua fé não desfaleça”), jamais
foi usada, nem mesmo pelos canonistas medievais, para documentar esse
dogma – o que é correto. Nessa passagem Jesus não prometeu a Pedro que
este não erraria mais, porém deu-lhe a graça de perseverar na fé até o
fim”.[6] Von Dollinger concorda plenamente:
Todos conhecem a clássica passagem da Escritura sobre a qual o edifício da infalibilidade papal tem se escorado “Eu,
porém, roguei por ti, para que a tua fé não desfaleça, tu, pois, quando
te converteres, fortalece os teus irmãos” (Lucas 22.32). Essas palavras referem-se especificamente a Pedro, à sua negação de Cristo e sua conversão…
É
totalmente contrário ao sentido original da passagem… encontrar nela
uma promessa de infalibilidade futura a uma sucessão de papas… Até o
final do século XVII nenhum escritor sonharia com tal interpretação;
todos eles, sem exceção – num total de 18 – explicam-na apenas como uma
oração de Cristo para que o seu apóstolo não sucumbisse e perdesse
inteiramente a sua fé na prova que teria de enfrentar em breve.[7]
Muitos
outros eminentes historiadores e teólogos católicos poderiam ser
citados do mesmo modo. Peter de Rosa acrescenta sua própria visão:
De
acordo com os Pais [da Igreja], Pedro não tinha sucessor algum. Eles
viam todos os bispos como sucessores dos apóstolos, não um bispo
sucedendo um apóstolo apenas, neste caso, Pedro. Logo, eles não poderiam
sequer ter aceito a alegação de que “o sucessor de Pedro” deveria
dirigir a Sé em Roma.
Também já vimos que todas as declarações de
doutrina, especialmente os credos, não vieram dos papas, mas dos
concílios. Nos primeiros séculos jamais ocorreu aos bispos de Roma que
eles pudessem definir doutrinas para toda a Igreja.[8]
Pedras Instáveis
Depois de ter prometido a Cristo na última ceia que preferia morrer a negá-lo, Pedro fez exatamente o contrário. “Então, começou ele a praguejar e a jurar: Não conheço esse homem!” (Mateus 26.74). Essa
é uma negação completa do próprio Cristo e do cristianismo como um
todo. Pedro era uma “pedra” muito instável para Cristo ter construído
sobre ele a sua Igreja! Porém seus supostos sucessores foram culpados de
coisas ainda piores.
Já mencionamos uma porção deles.
Consideremos brevemente mais um exemplo: o papa Júlio II (1503-1513),
sifilítico e infame mulherengo, pai de inúmeros bastardos. Ele comprou
sua posição no papado. Durante a Quaresma, enquanto os bons católicos
faziam dietas rigorosas, ele se deleitava com ricas iguarias. Usando sua
armadura, Júlio muitas vezes conduziu pessoalmente seus exércitos para a
conquista de cidades e territórios, com o objetivo de expandir os
Estados papais. Como poderia ser ele o vigário de Cristo, que afirmou
que o Seu reino não era deste mundo e que por isso os Seus súditos não
lutariam? Dizer tal coisa é zombar de Cristo e de Seus ensinos.
Sucessores de Imperadores
Lembre-se
que nos primeiros tempos da Igreja a infalibilidade não era atribuída
ao bispo de Roma, mas ao seu superior, o imperador. O papa Leão I
(440-461), por exemplo, concedeu a um imperador incrédulo a mesma
infalibilidade que Pio IX persuadiu os membros do Vaticano I a
declararem ter sido sempre o poder exclusivo dos papas. Leão I disse:
“Pela inspiração do Espírito Santo o imperador não necessita de
instrução humana e é incapaz de cometer erros doutrinários”.[9]
O
rasgado louvor que transcrevemos a seguir soa como aquele que hoje é
dado aos papas, mas trata-se de um discurso de Eusébio, honrando o
imperador pagão Constantino depois que este assumiu a liderança da
Igreja:
Deixemos, então, que apenas o Imperador… seja declarado
digno… livre… estando acima da sede de riquezas, superior ao desejo
sexual… que dominou as paixões que sobrecarregam o restante dos homens;
cujo caráter é formado conforme o original divino do Supremo Soberano, e
cuja mente reflete, como num espelho, a radiação de Suas virtudes. Além
disso, o nosso imperador é perfeito em prudência, bondade, justiça,
coragem, piedade, devoção a Deus…”[10]
Esse louvor era apenas para o imperador, que o colocava acima do bispo de Roma, o qual lhe era subordinado. Assim, Constantino chamou a si mesmo “bispo dos bispos”.
Hoje os papas que ostentam os títulos de Constantino e desfrutam de
suas regalias são seus legítimos sucessores e não os sucessores de
Pedro. O historiador Will Durant mostra que “durante a duração de seu
reinado, ele [Constantino] tratava seus bispos como auxiliares
políticos; os convocava, presidia seus Concílios e concordava em apoiar
qualquer opinião que a sua maioria formulasse”.[11]
A doutrina
nada significava para Constantino – apenas que os bispos deveriam
concordar com ele pelo bem da unidade imperial. Peter de Rosa cita um
bispo do século IV: “A Igreja [naquele tempo] fazia parte do Estado”.
Ele continua explicando:
Mesmo o bispo de Roma – que não foi
chamado de “papa” por muitos séculos – era, em comparação [com
Constantino], uma pessoa sem importância. Em termos civis, era um
vassalo do imperador; em termos espirituais, quando comparado a
Constantino, era um bispo de segunda classe…
Não o papa, mas ele
[Constantino], assim como Carlos Magno mais tarde, era o cabeça da
Igreja, sua fonte de unidade, diante de quem o bispo de Roma tinha de se
prostrar e declarar lealdade. Todos os bispos concordavam que ele [o
Imperador] era o “oráculo inspirado da sabedoria da Igreja”.
Portanto,
era Constantino e não o bispo de Roma quem ditava o tempo e o local dos
sínodos da Igreja e até mesmo estipulava como os votos seriam dados.
Sem a sua aprovação, eles não seriam legalizados; ele era o único
legislador do Império.[12]
A Herança Pagã do Papado
A idéia
de um Concílio da Igreja foi inventada por Constantino, o qual, apesar
de sua professa “conversão” a Cristo, continuou sendo pagão. Ele jamais
renunciou à sua lealdade aos deuses pagãos, jamais aboliu o altar pagão
de Vitória, no Senado, nem o das virgens Vestais; e o deus-Sol, não
Cristo, continuou a ser honrado nas moedas imperiais. Ele só foi
batizado pouco antes de sua morte, e mesmo assim, por Eusébio, um
sacerdote ariano herege. Durant nos revela que durante toda sua vida
“cristã” Constantino usava tanto os ritos pagãos como os cristãos e
continuava a confiar em “fórmulas mágicas para proteger as colheitas e
curar doenças”.[13]
O fato de Constantino ter assassinado todos os
que pleiteavam o seu trono [notoriamente seu filho Crispo, um sobrinho e
um cunhado] é uma evidência ainda maior que sua “conversão” ao
cristianismo era, como têm sugerido os historiadores, uma astuta manobra
política. O historiador e padre católico Philip Hughes nos lembra: “Em
seus atos, ele [Constantino] permaneceu sendo até o final de sua vida o
mesmo pagão de sempre. Seus ataques de fúria, a crueldade que, uma vez
despertada, não poupava nem a vida de suas esposas e filhos, são… um
desagradável testemunho da imperfeição de sua conversão”.[14]
Os
três filhos “cristãos” de Constantino (Constantino II, Constâncio II e
Constanço), asseguraram, após a morte de seu pai, a posse de suas
regiões separadas do império depois de um massacre implacável da
família. Eles conseguiram levar a “cristianização” do Império a um
patamar ainda maior. Foram eles, (e não Pedro) os antecessores dos papas
da atualidade.
Como já foi dito, Constantino convocou,
estabeleceu o que seria discutido, fez o discurso de abertura e
desempenhou um papel proeminente no primeiro Concílio Ecumênico da
Igreja, o Concílio de Nicéia, e também em uma porção de concílios, assim
como faria Carlos Magno, 500 anos depois. Tendo em vista que os
imperadores convocavam os concílios, não é de admirar que nenhum dos que
foram realizados nos primeiros 1000 anos tenha reconhecido o bispo de
Roma como cabeça da Igreja.
Cristo exemplificou a humildade e serviço aos outros. Ele disse aos Seus discípulos: “Os
reis dos povos dominam sobre eles, e os que exercem autoridade são
chamados benfeitores. Mas vós não sois assim; pelo contrário, o maior
entre vós seja como o menor; e aquele que dirige seja como o que serve” (Lucas 22.25-26). Esquecendo essa admoestação, os papas imitaram os imperadores pagãos, de quem herdaram sua posição e poder.
Cristo
também condenou a posição autoritária exercida pelos rabinos em Seus
dias. Suas palavras aos líderes da religião judaica são deveras
apropriadas à hierarquia católica romana:
“Amam o primeiro
lugar nos banquetes e as primeiras cadeiras nas sinagogas, as saudações
nas praças e o serem chamados mestres pelos homens. Vós, porém, não
sereis chamados mestres, porque um só é vosso Mestre, e vós todos sois
irmãos. A ninguém sobre a terra chameis vosso pai; porque só um é vosso
Pai, aquele que está nos céus…
Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque sois semelhantes aos sepulcros caiados, que, por fora, se mostram belos, mas interiormente estão cheios de ossos de mortos e de toda imundícia… por dentro, estais cheios de hipocrisia e de iniqüidade” (Mateus 23.6-9; 27-28).
(Dave Hunt - http://www.chamada.com.br)
Notas
- Austin Flannery, O.P., (editor geral), Vatican Council II: The Conciliar and Post Conciliar Documents (Costello Publishing, 1988, Revised Edition) vol 1, p. 454.
- J. H. Ignaz von Dollinger, The Pope and the Council (London, 1869), p. 74.
- Peter de Rosa, Vicars of Christ: The Dark Side of the Papacy (Crown Publishers, 1988), pp. 24-25.
- Dollinger, op. cit., pp. 53, 66, 74.
- Cormenin, History oft he Popes, p. 243, citado em R.W. Thompson, The Papacy and the Civil Power (New York, 1876), p. 248.
- August Bernhard Hasler, How the Pope Became Infallible (Doubleday & Co., Inc., 1981), p. 8 da introdução.
- Dollinger, op. cit., pp. 65-66.
- De Rosa, op. cit., p. 250.
- H. Chadwick, The Early Church (Wm. B. Eerdmans, 1976), p. 245.
- Eusebius, Oration on the Tricennalia of Constantine, 5.4.
- Will Durant, The Story of Civilization (Simon and Schuster, 1950), Part III “Caesar and Christ, p. 656.
- De Rosa, op. cit., p. 43.
- Durant, op. cit., Part III, p. 656.
- Philip Hughes, A History of the Church (London, 1934), vol. 1, p. 198.
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